“Não basta só ensinar ciência, tem que ensinar também política”, diz secretária-geral do Sind-UEA

“Não basta só ensinar ciência, tem que ensinar também política”, diz secretária-geral do Sind-UEA

No último dia 4 de setembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, suspendeu o piso salarial da Enfermagem e de técnicos e auxiliares da saúde aprovado no Congresso Nacional. Segundo o magistrado, não havia estudo de impacto sobre o poder público e privado a respeito do novo pagamento mínimo aos profissionais.
A decisão judicial teve forte reação por parte da categoria, que tem se mobilizado para garantir o direito a um salário digno. Para ampliar a discussão, o Sind-UEA entrevistou a secretária-geral do sindicato e enfermeira, Gisele Torrente, para tratar do tema. Confira abaixo.

Um piso salarial é essencial para garantir o trabalho digno em qualquer profissão. Porém, no caso de enfermeiros, técnicos e auxiliares, tem sido uma luta obter esse direito. A quê a senhora atribui tanta dificuldade para garantir o piso salarial?
A enfermagem quase não tem representatividade no poder Legislativo, quase nenhum senador, deputado ou vereador. Ocupamos cargos de gestão dentro do serviço, mas não temos essa representação. E para que qualquer projeto de lei seja votado, é preciso ter engajamento entre os parlamentares. Então, foram lutas e parcerias que culminaram com o protagonismo da enfermagem durante a pandemia, o que acabou sensibilizando o Legislativo para o apoio ao piso salarial.
Como a senhora viu a notícia de suspensão do piso salarial recém-aprovado?
Essa é uma notícia vergonhosa, porque os hospitais privados já se manifestaram contrários, por conta do custo, já que a enfermagem representa em torno de 60% a 65% do efetivo de um serviço de saúde, seja ele qual for. Então, a gente sabe que haverá impacto financeiro, mas é digno que tenhamos um piso salarial, não é mais, nem menos, é digno. A notícia de que isso foi vetado vejo como um retrocesso para o avanço da categoria e da dignidade profissional. A enfermagem sempre foi vista como caridade, sacerdócio, ao longo de toda a sua história. Mas a realidade é que é uma profissão excercida com ciência e extremamente importante para qualquer serviço de saúde. É preciso começar a dar o valor social a nossa categoria, além do reconhecimento financeiro, que é o piso.
Quais são as condições de trabalho de enfermeiros, técnicos e auxiliares na rede de saúde pública e privada, no país? De modo geral, quais os cenários mais comuns?
A gente sabe que no Sistema Único de Saúde (SUS), principalmente no Amazonas, há uma sobrecarga há anos, e já há estudos que apontam síndrome de burnout entre os profissionais, exaustidão mental, e muitos afastamentos por conta dessa condição. A carga horária alta e salário baixo faz com que colegas tenham que ter dois, até três empregos para conseguir se manter bem. E isso ocasiona problemas de saúde.
Para além do piso salarial, como valorizar mais esses profissionais?
O reconhecimento social da categoria é importante. Reconhecer quem somos na área de assistência à saúde. Sem a gente, não tem cuidado. Se removermos a equipe de enfermagem de um serviço de saúde, ele para. Então, as pessoas precisam entender que essa é a nossa força de trabalho.
Como a comunidade acadêmica, incluindo professores e alunos dessas áreas da saúde podem se engajar para apoiar essa luta?
Temos as entidades, que é a Aben, o Coren e o Cofen, que são entidades que nos ajudam na defesa da nossa categoria, e acredito que para que a profissão ganhe mais holofote, mais reconhecimento, é preciso que os professores dos cursos de enfermagem, bem como as universidades públicas e privadas, comecem a movimentar politicamente e socialmente o seu aluno.
Não basta só ensinar ciência, tem que ensinar também política voltada para a nossa categoria profissional. Quem é o Coren, o Cofen, a Aben, o sindicato dos enfermeiros se por aí vai, tentar elucidar a importância dessas entidades e como desempenham o papel de garantia dos direitos do profissional. Acho que a academia tem que se envolver nos movimentos estudantis e sindicais desde sempre.

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